* Nº 0451 - REINOS DAS ÁGUAS E DA PEDRA QUE CHORA - SÉRIE: CONTOS FANTÁSTICOS DE MAYANDEUA

 



No fundo do vasto oceano,  vivia uma misteriosa criatura. Seu nome era Aryalis, uma poderosa sereia cuja presença emanava tanto beleza quanto mistério. Diferente de qualquer outra sereia que já habitara as profundezas, Aryalis possuía dons especiais concedidos pelos antigos encantados, seres primordiais que protegiam os mares desde o início dos tempos. Ela podia comunicar-se com os espíritos marinhos, curar doenças com suas canções hipnóticas e adentrar estados profundos de consciência, nos quais vislumbrava fragmentos do futuro.

Ao longo dos anos, Aryalis sentiu uma inquietação crescente no coração. Era como se as águas ao seu redor estivessem carregadas de sinais invisíveis, presságios que ecoavam nas marés e nas correntes. Uma sensação de urgência tomou conta dela: algo de grande importância estava prestes a acontecer no mundo dos vivos, algo que poderia alterar para sempre o equilíbrio entre o céu, a terra e o mar. Mas, por mais que tentasse decifrar os sinais, Aryalis não conseguia discernir exatamente qual seria esse evento ou como deveria agir.

Movida por essa intuição profunda, Aryalis começou a alertar os outros seres marinhos sobre a necessidade de prepararem-se para uma mudança significativa. Suas irmãs sereias, os botos sábios, as cobras-grande, as feiticeiras das águas, as matintas protetoras e até mesmo os curupiras aquáticos reuniram-se para ouvir seus avisos. As ondas ecoavam com suas melodias proféticas, que eram ao mesmo tempo belas e assustadoras. Em cada nota, ela transmitia mensagens urgentes: "Preparem-se. O destino está mudando, e devemos estar prontos para proteger o equilíbrio."

Mas Aryalis sabia que sua missão não terminava ali. Para que os seres da superfície também fossem informados do que estava por vir, ela precisava deixar um símbolo tangível, algo que pudesse atravessar o véu entre os mundos. Após longas meditações, ela escolheu uma ilha remota e isolada. Poucos humanos ousavam aventurar-se até lá, e aqueles que o faziam frequentemente voltavam com histórias de encontros místicos e visões inexplicáveis.

Naquela ilha, Aryalis ergueu uma grande pedra, esculpindo-a cuidadosamente com inscrições antigas que falavam sobre o poder do xamã e sua conexão com os espíritos e a natureza. A pedra era mais do que uma mensagem; era um portal entre os mundos, uma ponte entre o humano e o divino. Quem conseguisse decifrar suas inscrições seria agraciado com sabedoria e proteção dos espíritos marinhos. No entanto, Aryalis sabia que apenas alguém com uma alma pura, profundamente conectada à espiritualidade e à natureza, seria capaz de desvendar seu enigma.

Os anos se passaram, e a ilha tornou-se conhecida entre os navegantes como um lugar misterioso e repleto de magia. Muitos aventureiros e curiosos tentaram decifrar o significado das inscrições, mas nenhum teve sucesso. Alguns retornavam frustrados, enquanto outros partiam com histórias de sonhos estranhos e visões fugazes. Aryalis observava tudo de longe, esperando pacientemente o dia em que alguém digno apareceria.

Até que, um dia, uma jovem curandeira chamada Potiryus chegou à ilha. Desde o momento em que pôs os pés na praia, Aryalis soube que ela era especial. Observou Potiryus lendo os ventos, tratando plantas com cuidado e cantando canções suaves para os pássaros que voavam ao seu redor. Sua energia era diferente – gentil, mas firme, conectada às forças naturais de maneira quase mágica. Era a candidata perfeita para desvendar o segredo da pedra.

Em uma noite de lua cheia, Potiryus aproximou-se da pedra. Ela sentou-se diante dela, fechou os olhos e concentrou-se profundamente. Sua alma sincera e sua conexão com a natureza foram suas maiores aliadas naquele momento. Ao tocar a pedra, as inscrições começaram a brilhar, revelando seu significado em uma linguagem que só Potiryus conseguia entender. E, nesse instante, ambas – a sereia e a curandeira – "choraram". Não eram lágrimas de tristeza, mas de compreensão e união, como se dois mundos finalmente se encontrassem.

Aryalis emergiu das águas em sua forma esplendorosa, brilhando como mil luas. Com um sorriso terno, ela disse: "Você é a escolhida, Potiryus. Está pronta para receber o conhecimento dos encantados e cumprir seu destino. Ela, ainda emocionada, aceitou a missão com humildade e gratidão. A partir daquele momento, a moça tornou-se uma guardiã dos segredos do xamã, uma intermediária entre o mundo humano e o mundo espiritual. Ela trouxe harmonia e cura para sua comunidade, ensinando as pessoas a ouvir os sussurros da natureza e a respeitar os ciclos da vida. Cada planta que colhia, cada canto que entoava e cada ritual que realizava era guiado pela sabedoria ancestral que Aryalis lhe havia concedido.

Graças ao alerta de Aryalis e ao poder do xamã, a conexão entre os reinos da água e da terra foi restabelecida. O equilíbrio voltou a fluir, e as marés, antes agitadas, tornaram-se calmas novamente. A lenda da sereia Aryalis e da curandeira Potiryus ficou como um lembrete da importância de ouvirmos os sussurros dos encantados e respeitarmos a sabedoria da natureza.

- Eis os muitos  segredos desta ilha encantada....

Dizem que poucos sabem verdadeiramente o que aconteceu naquela ilha. Apenas os mais sensíveis conseguem sentir a energia que ainda pulsa ali, vibrando em harmonia com as marés. A pedra, agora silenciosa, ainda guarda seus mistérios. O que se sabe é que a ilha continua sendo um lugar de mistérios onde o tempo parece parar e os limites entre o real e o místico desaparecem. E, enquanto o oceano continuar a contar suas histórias, a memória de Aryalis e Potiryus viverá para sempre, inspirando aqueles que buscam compreender a magia que une todos os seres de todos os mundos existentes no Universo. 

- Mas,  dizem que a Pedra esta morrendo...

- Vixi !!!


FIM

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Projeto Musical e Literário Primolius Nº  0451


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