* Nº 0915 - RAÍZES DO NORTE - SÉRIE: CRÔNICAS DE MAYANDEUA




(Direto de Mayandeua)

Há algo de mágico nos homens do Norte, esses seres de pele trigueira e fardagens leves que parecem dançar ao ritmo da brisa amazônica. Eles são filhos do sol, do rio e da noite estrelada, acolhedores por natureza, como se tivessem aprendido com a própria terra a arte de receber. São homens de sorte, não porque acumulam riquezas, mas porque carregam consigo o privilégio de pertencer a uma terra tão rica em cores, sons e sabores.

Namoradores inveterados, orgulhosos de suas raízes, eles estudaram nas escolas dos botos da noite, aqueles encantados que surgem nas águas escuras para ensinar segredos que só os mais sensíveis conseguem entender. Convocam perdão com um olhar, dormitam ao vento que balança as redes e entorpecem-se ao fitar as morenas que passam, carregando consigo o perfume de manga que é quase um sinal de identidade.

Manifestam poesia sem esforço, como se as palavras brotassem naturalmente de seus lábios. São homens pátrios destas águas, filhos legítimos do sol e da noite que lhes aformoseiam a simpatia. Suas letras têm cheiro de fruta madura, gosto de rio e cor de terra molhada. Virtuosos por maestria, trazem em si uma etnia de fantasia, uma mistura de culturas que se fundem em harmonia, criando uma pátria única, habitada por fidedignos mandingueiros que conhecem os segredos das ervas, dos ventos e das marés.

São os poetas caboclos, acessíveis e dadivosos com suas companheiras, sempre prontos a oferecer um sorriso ou uma palavra gentil. Podem ser encontrados debruçados em janelas centenárias, observando o tempo passar, ou pescando num casquinho à deriva no encontro do rio com o mar. No núcleo da capital, onde o barulho do mundo moderno tenta abafar as vozes antigas, ainda exprimem palavras filarmônicas, tecendo histórias de pecados, mistérios e bel-prazeres das morenas que cruzam seus caminhos.

É o Homem do Norte, quiçá encantado, que vive esperando passar o arcaico tempo. Mas ele sabe que o tempo, aqui, não é algo a ser medido em relógios ou calendários. Ele é feito de notícias morenas, de peles douradas pelo sol, de mangas suculentas e risos fáceis. É um tempo que resiste às mudanças, guardando intacta a essência de quem aprendeu a viver em harmonia com a natureza e com o coração.

E assim seguem esses homens, legítimos representantes de uma cultura que insiste em florescer mesmo diante das adversidades. São eles os guardiões das histórias, os cantores das águas e os sonhadores das noites estreladas. Quiçá, realmente, sejam encantados.

Assim escreveu Primolius em uma noite de chuva na ilha....


FIM

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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0915


 

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