N° 0939 - O PORTAL DAS FEITICEIRAS DO MAR - SÉRIE: CONTOS FANTÁSTICOS DE MAYANDEUA



Nas pedras do Boiador, onde as águas guardavam segredos ancestrais, erguia-se o enigmático Portal das Feiticeiras do Mar: uma arcada de coral negro adornada por pérolas luminescentes que pulsavam em sintonia com o coração do oceano. Apenas em noites de lua, quando a maré alta beijava a constelação da Serpente Adormecida, o portal revelava sua verdadeira essência – um limiar sagrado entre as profundezas e a terra dos mortais, elo vivo com os mistérios de Mayandeua.

As guardiãs desse portal eram criaturas de beleza sobrenatural. Seus corpos  capturavam a luz da lua, enquanto cabelos líquidos, em tons de esmeralda, se agitavam como correntes encantadas. Seus olhos, profundos como abismos, guardavam a memória dos séculos, e suas vozes eram capazes tanto de acalmar tempestades quanto de despertar entidades adormecidas. Naquela noite de Junho, a lua  pairava como um olho flamejante sobre o céu de Algodoal. No coração da ilha, além das dunas as feiticeiras se reuniam em seu  círculo ancestral, convocadas pelos Encantados que habitavam os véus entre os mundos não desapercebidos por muitos das ilhas de Algodoal e Mayandeua. O ar vibrava com um peso naquele momento.

— Os tambores de fora soaram — anunciou Naréia, a mais anciã, sua voz rouca como conchas partidas. — Pelos ecos dos reinos, fomos alertadas: uma embarcação de sombras e silêncio aproxima-se de nossa ilha. Um arrepio percorreu o círculo. Sob a luz vermelha da lua, as formas  das feiticeiras tremularam.

— Não são viajantes comuns — murmurou Maré, guardiã das rochas profundas, seus cabelos revoltos como ondas em fúria. — São espiões de um poder esquecido, despertado das fendas do oceano. Buscam o castelo da Princesa destas águas .

O nome da Princesa de Algodoal trouxe tensão súbita. Guardiã de uma linhagem mágica ancestral, seu castelo erguia-se sobre um ponto de convergência de energias místicas das dunas — última defesa contra as trevas submarinas.

— Desejam a fonte de poder que emana de seu domínio — prosseguiu Naréia, com o olhar perdido no horizonte invisível. — Se a conquistarem, erguerão seu reino submerso sobre a superfície, rompendo o equilíbrio destas paragens.

Foi então que uma jovem aprendiz, Liora — cujos olhos refletiam o brilho das estrelas cadentes — ergueu timidamente a voz:

— Como iremos reconhecê-los entre nós?

O silêncio caiu. As águas ao redor pareciam prender o fôlego à espera da resposta.

— Eles carregam o frio do abismo no coração — disse Naréia. — Seus passos não marcam a areia molhada, e seus olhos... não refletem a luz das estrelas. São vazios como fossas oceânicas. As feiticeiras entoaram cânticos, erguendo barreiras de vento e mar, convocando outras irmãs. Mas sabiam: a ameaça era insidiosa, capaz de infiltrar-se até pelas correntes mágicas que protegiam Algodoal e Maya.

Quando a reunião se desfazia, Naréia chamou Liora de lado. Retirou de sua concha sagrada um cristal marinho de azul profundo, que cintilava como coração vivo.

— Você nasceu quando o Portal se abriu pela última vez. Agora será nossa sentinela. Ao amanhecer, vá ao farol abandonado. Busque pegadas frias na areia, sombras que caminham contra o vento e vozes ocas.

— Mas, Mestra Naréia... por que eu? Sou a mais inexperiente.

Um sorriso enigmático iluminou o rosto da anciã.

— Porque você carrega o pulsar do Portal em seu sangue. Este cristal sussurrará segredos que apenas você poderá ouvir.

Enquanto a lua descia no horizonte, o portal vibrava nervoso, como se pressentisse a aproximação do perigo. Liora contemplava o cristal, que palpitava em harmonia com seu coração, e sabia que o amanhecer traria sua primeira provação.

O que ela ainda ignorava era que, no mesmo instante, uma figura solitária já emergia na costa Norte. Cada passo deixava algas mortas e areia enegrecida em seu rastro. O primeiro espião havia chegado, e com ele, o prelúdio de uma guerra entre dois mundos — o da superfície, banhado pelo sol, e o das profundezas, onde a luz jamais ousa tocar.

E assim, sob o olhar vigilante do portal,  as peças de um antigo conflito voltavam a se mover, desafiando o equilíbrio guardado pelas Feiticeiras do Mar ao longo dos séculos. 

- E asim, mais uma história de mundos reinicia nas águas de Algodoal e Mayandeua....

- Primolius, como sempre irá nos relatar este novo fato....

- Ondas de grande força chegam ao  Boiador!


FIM

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Projeto Literário e Musical Primolius N° 0939
  


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