* N° 0901 - O VENTO NOSSO DE CADA DIA - SÉRIE: CRÔNICAS DE MAYANDEUA
Nas camadas mais profundas do descanso, onde o consciente se dissolve e o inconsciente assume o palco, surgem vislumbres de segredos primordiais. É nesse limiar, tênue e misterioso, que o despertar se entrelaça ao repouso, e a essência da existência se revela em pequenos fragmentos. Ali, os sussurros suaves das ondas fundem-se em melodias ancestrais, ressoando como uma canção perpétua ao longo da trajetória da vida.
Imerso na escuridão aconchegante das noites quentes, ele se entrega ao ritmo sutil das águas. Essa presença fluida e constante envolve sua alma com a delicadeza de mãos invisíveis, dissipando todo o peso do mundo. Cada onda carrega consigo o alívio do tempo passado, como se o mar, em sua sabedoria, sussurrasse antigas promessas de renovação. No limiar entre o ser e o sonhar, ele se torna metade humano, metade miragem, dançando na fronteira entre dois mundos – um pé na solidez do agora, o outro mergulhado na imensidão do que ainda não foi.
Mesmo no silêncio noturno, as vozes da vida se fazem presentes. Cada palavra, ecoando nos corredores da mente, acende pequenas luzes no caminho sinuoso que ele percorre, guiando-o por essa viagem cheia de nuances. A existência, vista através da lente dos sonhos, transforma-se em um teatro grandioso onde a realidade se reinventa a cada ato. O hemisfério da luz, construído sobre as fundações de vivências acumuladas, surge triunfante. Seres nus, corajosos e destemidos, movem-se em sincronia, desafiando o inevitável, enfrentando ventos contrários com uma elegância silenciosa. Seus gestos são como o movimento pendular de um relógio cósmico, oscilando entre a gravidade e o infinito, moldando o tempo com a graça de uma dança celestial.
Enquanto repousa, ele desenha versos invisíveis na areia de seus pensamentos, traçando poesias que se dispersam nas névoas do oceano. Palavras perdidas que, ao serem carregadas pelas marés, levam consigo pedaços secretos de sua essência, deixando para trás ecos que só o fundo do mar pode compreender. A mente, em seu turbilhão, reorganiza a vida como um mosaico incompleto, aguardando que cada peça encontre seu lugar. Entre sorrisos fugazes e lágrimas contidas, ele avança descalço, deixando que o calor do sol ilumine cada pegada deixada na areia.
Seu sono é um quadro em movimento, uma promessa de um novo alvorecer que trará consigo mais do que luz: uma renovação, uma clareza para os próximos passos a serem dados. Pois mesmo na escuridão, onde tudo parece se esconder, histórias inteiras aguardam para serem vividas, com seus heróis, vilões e dilemas. Medos e esperanças entrelaçam-se, compondo uma narrativa que clama por expressão. Cada cheiro, cor e pensamento que o atravessa é como uma página em branco esperando por palavras que a preencham.
A vida se manifesta como uma carta de amor aos trópicos, uma sinfonia dedicada ao mar, na expectativa de que suas palavras sejam ouvidas como um novo idioma, um cântico que ecoa nas ondas. A arte de existir, assim como as marés, é um ciclo perpétuo: flui, recua e se renova, num eterno retorno. Que sua jornada entre sonhos e realidade continue a revelar novos caminhos e a transformar cada momento em poesia. Ventos destes lugares.... Apenas o vento...
- E assim as criaturas do vento de Maya, não dormem!
FIM
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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0901