* Nº 0856 - SEGREDOS DA MARÉ ENLUARADA - SÉRIE: CONTOS FANTÁSTICOS DE MAYANDEUA
Naquela noite enluarada, a luz prateada do luar banhava Mayandeua com uma serenidade muito delicada. As estrelas, tímidas, escondiam-se por detrás das nuvens, como se respeitassem o brilho imponente da lua que reinava absoluta no céu. Era uma cena de beleza pura, onde o mistério e a paz se entrelaçavam, dançando juntos ao som suave das ondas do mar. Mayandeua, uma ilha envolta em segredos, trabalhava incessantemente. Nas margens, as mãos calejadas dos pescadores moviam-se com precisão, guiadas pelo conhecimento ancestral que fluía através de seus ancestrais. Era uma noite de trabalho árduo, mas também de comunhão com a natureza. Cada maré, cada corrente, era uma velha conhecida, uma amiga que, às vezes, se mostrava caprichosa, mas sempre generosa. A maré estava de lance, um termo que, para muitos, poderia parecer estranho, mas para os habitantes de Mayandeua, era um sinal de oportunidade. Era o momento em que o mar revelava seus tesouros ocultos, e os pescadores, com suas redes e barcos, lançavam-se em busca do sustento que a natureza lhes oferecia. Era um ritual quase sagrado, uma dança de paciência e habilidade, onde cada movimento era calculado, cada gesto um elo na corrente invisível que unia o homem ao mar.
Havia algo de misterioso naquela noite. Os pescadores, enquanto trabalhavam, sentiam uma presença, uma força ancestral que parecia observá-los. As sombras dançavam sob o brilho da lua, criando formas que desafiavam a imaginação. Era como se os espíritos dos antigos navegantes, que há muito haviam cruzado aquelas águas, estivessem ali, guiando e protegendo os filhos da ilha. E assim, entre o brilho do luar e o murmúrio do mar, Mayandeua seguia seu curso, produzindo as suas memórias, embaladas pela maré que sempre voltava com novos ventos, trazendo assim, a promessa de um novo dia e de novas esperanças. A ilha, com seus segredos e belezas, continuava a inspirar e desafiar, uma eterna guardiã das histórias não contadas que sussurravam ao vento. Entretanto, à medida que a noite avançava, um pescador chamado Aruã começou a notar algo peculiar. Ele era conhecido por sua habilidade e intuição apurada, mas naquela noite, sentia-se inquieto. Suas redes, sempre tão cheias, estavam vazias, como se o mar estivesse guardando seus tesouros. Ele observou que os outros pescadores também estavam com poucas capturas, e uma sensação de estranheza tomou conta de todos.
De repente, uma figura emergiu das sombras, alta e esguia, com olhos que brilhavam como a própria lua. Era uma mulher de aparência calma, vestida com trajes que pareciam feitos de luz e espuma do mar. Aruã a reconheceu imediatamente: era a guardiã da ilha, uma entidade que, segundo as lendas, aparecia apenas em momentos de grande necessidade. "Não temam," disse a figura com uma voz que parecia um canto. "Estou aqui para lembrar-lhes de um segredo antigo, esquecido pelo tempo. A maré de lance não se revela apenas aos olhos que buscam o sustento material, mas também àqueles que procuram o verdadeiro tesouro da ilha." Intrigados, os pescadores seguiram a guardiã até uma parte da costa que era raramente visitada. Lá, sob a luz suave da lua, ela revelou uma gruta escondida pela maré alta. No interior, uma série de desenhos e inscrições antigas decoravam as paredes, contando histórias de navegantes, tempestades, e de uma riqueza que ia além do ouro e das pérolas: o conhecimento e a harmonia com a natureza. A guardiã explicou que o verdadeiro tesouro de Mayandeua estava na sabedoria ancestral que ali residia, na conexão profunda com o mar e a terra. Ela ensinou-lhes rituais e cânticos esquecidos, e como interpretar os sinais da natureza de uma maneira mais profunda. Os pescadores, absorvendo esse conhecimento, sentiram-se renovados.
Quando a aurora começou a despontar, a figura etérea começou a se desvanecer, deixando os pescadores com uma nova compreensão e um sentimento de reverência. Aruã, olhando para o mar, agora via mais do que apenas um meio de sustento; via um parceiro, um guia, um guardião de segredos profundos. A partir daquele dia, Mayandeua prosperou como nunca antes. Os pescadores, agora mais conectados com a sabedoria da ilha, encontraram novas formas de viver em harmonia com o mar, e suas redes nunca mais voltaram vazias. A ilha, com seus mistérios e encantos, continuou a inspirar e proteger seus habitantes, uma guardiã eterna de histórias não contadas, sempre sussurrando segredos ao vento.
- E assim eis mais uma guardiã deste misterioso lugar!
- Coisas deste solo de mar!
FIM
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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0856