N° 0791 - ENCANTOS DE MAR - CRÔNICA

 


Lembro-me claramente dos dias da minha infância, quando o mundo se transformou em um vasto deserto. Os pássaros costeiros, uma vez companheiros brincalhões do céu, pareciam ter abandonado seus trinados e voos para sempre por entre as marés, deixando um silêncio pesado em seu rastro. As estrelas, antigamente guias luminosas na escuridão da noite, perderam seu brilho e desapareceram na penumbra do esquecimento dos barcos de outrora. E o mar, sempre imenso e eterno, parecia ter se extraviado de seu leito centenas de vidas, como se um capricho do destino o tivesse arrastado para longe de suas costas naturais.

Naqueles momentos, o mundo inteiro parecia ter se transformado em uma tumba, um buraco escuro que devorava a vida e a esperança com voracidade insaciável. Cada canto, cada recanto, ressoava com o eco surdo, enquanto o futuro escorregava entre nossos dedos como areia fina de praia em um relógio desenhado em alguma praia do mundo.

À medida que outros também contemplavam a ausência dos pássaros, percebemos que não eram apenas aves comuns que habitavam nossos céus. Eles eram migrantes de ilhas distantes, viajantes alados que cruzavam vastos oceanos em busca de novos horizontes. Seus cantos eram melodias de terras distantes, ecoando através das brisas marítimas com um chamado ancestral que despertava memórias esquecidas de muitos sentimentos deixados no mar.

Enquanto refletíamos sobre a partida desses pássaros, uma sensação de saudade misturada com admiração nos envolvia. Admirávamos sua coragem em enfrentar os ventos tempestuosos e as vastidões desconhecidas do oceano, enquanto lamentávamos a perda da beleza e da alegria que eles traziam para nossas vidas. No entanto, mesmo na ausência de suas asas, sabíamos que sua presença ainda ecoava nos céus, lembrando-nos da interconexão de todos os seres vivos neste vasto e maravilhoso mundo que advém dos mares.

E assim, enquanto o sol se punha no horizonte distante, encontramos conforto na certeza de que, apesar das mudanças e das perdas, a vida continuaria a florescer em sua eterna dança de renovação. Pois, assim como os pássaros migratórios retornam na primavera, trazendo consigo a promessa de um novo começo, também nós encontraríamos dentro de nós a força para seguir em frente, guiados pela esperança e pela memória da beleza que um dia conhecemos.

- "Voltem, pássaros! Precisamos de suas cores no céu."


FIM

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Projeto Musical e Literário Primolius N° 0791

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