*Nº 0318 - GAIVOTAS SEM ASAS - SÉRIE: CRÔNICAS DE MAYANDEUA
Em meio ao tumulto das grandes cidades, onde o concreto parece engolir os suspiros da natureza, uma estranha sensação de ausência paira sobre nós. Onde antes ecoavam os acordes dos violeiros e os trinados dos pássaros, agora reina um silêncio perturbador, como se a própria alma da metrópole estivesse em luto. As estações já não se manifestam com a mesma intensidade, e a chegada do inverno perdeu aquele frescor revigorante que agitava as folhas das árvores. Em seu lugar, resta apenas o eco vazio das ruas, onde a pressa e a indiferença parecem ser as únicas melodias que ressoam pelos corredores urbanos.
Nas relações humanas, essa ausência também se faz presente. As cantigas dos amigos, que outrora embalavam nossas conversas em tardes preguiçosas, deram lugar ao ruído superficial das redes sociais e das mensagens digitais. Os abraços fraternos foram substituídos por emojis e likes, deixando para trás uma sensação de solidão disfarçada sob o véu da conectividade virtual. E onde estão os pássaros, com suas melodias encantadoras? Nem mesmo o canto das sabiás ou o trilar do curió encontram espaço nas praças e parques urbanos, sufocados pelo rugido incessante do tráfego e pelas buzinas impacientes.
Diante desse vácuo de sons e cores, até mesmo o céu noturno parece ter perdido sua magia ancestral. Onde está a constelação que um dia guiou os passos dos navegantes, apontando caminhos para novas descobertas e aventuras? E, no meio de tudo isso, onde está o "eu" que um dia conhecemos? Será que também nos perdemos nesse labirinto de ausências, buscando sentido em um mundo que parece ter esquecido o seu próprio? Talvez, em meio ao caos e à correria do cotidiano, tenhamos nos esquecido de olhar para dentro de nós mesmos, de nos reconectar com nossa essência mais profunda.
Mas, mesmo diante desses desafios, uma pequena centelha de esperança ainda brilha no horizonte. Talvez seja possível resgatar a harmonia perdida, reconstruir os laços que se romperam e redescobrir a beleza esquecida da vida cotidiana. Talvez, além do horizonte urbano, ainda exista um refúgio onde possamos nos reconectar com a natureza e com nossa própria humanidade. Enquanto aguardamos por esse dia incerto, resta-nos manter viva a chama da esperança, sabendo que, mesmo nas noites mais escuras da alma, há sempre uma luz a nos guiar de volta para casa.
E assim, enquanto caminhamos por entre os mistérios da ausência, surge no horizonte algo diferente. Um chamado suave, quase imperceptível, mas cheio de promessas. É Mayandeua que emerge no horizonte do mar, carregando consigo os segredos de tempos antigos, guardados em suas praias e florestas. Sua presença é um lembrete de que, mesmo em meio ao caos, há lugares onde a vida ainda pulsa em sua forma mais pura.
- Assim, Mayandeua surge no horizonte do Mar!
- E todos os seus segredos certamente ainda ficarão por lá...
- Ilha à vista!
FIM
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Projeto Musical e Literário Primolius Nº 0318