Nº 0772 - CANTOR DE LUA - CRÔNICA

 


Na serenidade da noite, sob a penumbra de uma sala envolta em silêncio, repousa uma velha cadeira, estrategicamente posicionada entre o sofá e a mesa. Testemunha muda das inúmeras histórias e memórias que permeiam o espaço, ela serve de palco a um espetáculo singular nesta noite. Sob a luz sutil, filtrada pelas cortinas e banhada pela prata lunar, um pequeno besouro descobre seu cenário inusitado para uma performance solitária.

Com asas que capturam e refletem o brilho  da lua esgueirando-se pela janela, o besouro eleva-se, equilibrando-se sobre suas frágeis extremidades. Inicia-se, então, um canto suave e melodioso, uma verdadeira serenata à solitude da noite e das ondas do mar distante. À medida que os ponteiros do relógio se arrastam, a melodia do besouro preenche o ambiente, suas notas delicadamente ecoando pelas paredes da sala  e quintal. É uma partilha de seus mais íntimos pensamentos e sentimentos, uma celebração da vida sob o manto da lua de Maya.

Seus movimentos são repletos de graça; suas melodias, de harmonia. Cada vibração de suas asas parece compor uma nota distinta em uma orquestra. O besouro, agora maestro de sua própria sinfonia, guia uma orquestra imaginária de sons e emoções, reverberando agora com o vento que trará mais tarde uma chuva de inverno. E a lua e as feiticeiras que chegam do Portal , vigilantes no firmamento, parecem curvar-se, envolvendo o besouro em sua própria luz, enquanto este prossegue em sua cantoria. Parece haver uma comunhão silenciosa, na qual cada nota é absorvida e transformada em um som de metais , difundindo-se pela sonoridade da noite. 

Assim, na antiga cadeira situada entre o sofá e a mesa, em uma determinada pousada da ilha de Maya  um besouro solitário seduz a lua com sua serenata , evocando a lembrança de que a beleza e a harmonia existem nos mais improváveis recantos.

Assim...

Na antiga cadeira de palha ,

Entre sofá e mesa,

Um besouro à lua entoa sua prece.


FIM

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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0772



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