*Nº 0536 - O AVIÃO E O BEM-TE- VI - SÉRIE: CRÔNICAS DE MAYANDEUA
O dia nasceu como um poema pintado em azul, uma manhã que parecia ter sido feita sob medida para quem ousasse olhar para cima. No quintal tranquilo, um pequeno bem-te-vi, de plumagem amarela e olhos vivos, observava o mundo ao redor. Ele era um sonhador — seu canto não era apenas uma saudação ao dia, mas um manifesto de sua vontade de voar mais alto, de explorar o que havia além das árvores e das nuvens.
Enquanto isso, a quilômetros dali, no asfalto quente do aeroporto, um gigante metálico aguardava seu momento de desafiar a gravidade. O avião, com sua fuselagem brilhante e motores potentes, era um símbolo de poder e engenhosidade, mas também de dependência. Sem seus pilotos e sem a complexa rede de comunicação no solo, não passava de uma imensa estrutura presa ao chão.
No quintal, o bem-te-vi levantou voo, suas asas movendo-se com graça e determinação. Ele seguia o som distante do avião, que rugia ao iniciar sua decolagem. Para o pequeno pássaro, o avião era uma inspiração: uma criatura gigantesca que se erguia ao céu como ele tanto desejava fazer. Para o avião, que não possuía olhos, mas parecia ter alma, o bem-te-vi representava o que lhe faltava: a liberdade do voo puro, sem trilhas predeterminadas, sem controle externo.
E então, naquele momento mágico, o céu uniu essas duas almas aladas. O bem-te-vi subiu cada vez mais alto, suas asas pulsando com o desejo de tocar o infinito. Ao mesmo tempo, o avião rasgava os ares, pesado e imponente, mas com uma elegância que contrastava com sua estrutura. Por um instante breve, mas inesquecível, eles dividiram o mesmo espaço aéreo, um encontro improvável entre o natural e o construído.
O avião, em sua grandiosidade, parecia reconhecer a coragem do pequeno pássaro. E o bem-te-vi, com sua inocência, admirava a capacidade do gigante de cruzar oceanos e unir mundos. Era como se ambos compreendessem que, apesar de suas diferenças, compartilhavam o mesmo céu e o mesmo sonho: o desejo de voar.
Quando o avião desapareceu no horizonte, seguindo sua rota para terras distantes, o bem-te-vi retornou ao quintal. Mas algo nele havia mudado. Seus olhos brilhavam com uma nova compreensão: ele não precisava ser grande como o avião para alcançar o céu. Ele já era um mestre do voo, um sonhador nato. No aeroporto, o avião continuava sua jornada, levando pessoas, histórias e sonhos. No quintal, o bem-te-vi pousava em um galho, satisfeito por ter tocado algo além do físico, algo que unia todos os seres alados.
E acima de tudo isso, como espectador encantado, estava o Primolius, o papagaio verde e dourado. Ele observava a dança no céu. Porque, no fim, a história do bem-te-vi e do avião é uma metáfora para todos nós. Voar é mais do que levantar-se do chão. É acreditar no impossível, explorar o desconhecido e conectar-se com aquilo que nos inspira.
E assim, o céu, sempre tão vasto e acolhedor, continua a ser o palco onde pássaros, aviões e sonhos se encontram, lembrando-nos de que o desejo de alcançar o inalcançável é o que nos torna verdadeiramente vivos.
- Principalmente no céu de Mayandeua- Algodoal!
- Ufa!
FIM
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Projeto Literário e Musical Primolius - Nº 0536