VERSÃO VÍDEO: HOMEM Nº 0508 - CRÔNICA

 



Carta de 1998 ( Relendo na ilha)  

Havia uma cidade moderna, onde a luz do vídeo iluminava as vidas das pessoas. Nas casas, cadeiras sustentavam a razão do contemporâneo: centenas de programas transmitidos através de telas brilhantes. O homem, como tantos outros, começava seu ritual diário no divã, um local de conforto onde ele se entregava ao controle remoto.

Ao apertar os botões, ele mudava o mundo ao seu redor. Muitos se deleitavam com as intermináveis jornadas das novelas, seduzidos pela essência da verdade que elas prometiam. Naquele mundo da ficção, tudo era perfeito, e a vida real desaparecia na frente das telas.

O espaço ao redor estava surdo, corações que não se casavam mais. Os casais trocavam as carícias pela dramaturgia de massa, enquanto audiências deflagravam sua própria guerra de emoções através daquelas imagens. O silêncio preenchia a sala, o quarto, a casa. O homem, em seu estado estático, controlava sua própria vida na televisão.

As imagens eram límpidas, e as mãos não paravam de apertar os botões. Tudo parecia perfeito. O homem, ser opaco das madrugadas e manhãs, via seus olhos brilharem por causa das novidades trazidas pelos eleitos da fama. Mas, apesar de estar em meio a tantas imagens e sons, ele escutava o silêncio do vazio ao seu lado.

Enquanto ele respirava a luz da televisão, bombas despejavam pólvora em algum lugar distante. As plateias estavam lotadas, muitos peleavam na TV pela razão do amor. E nas casas felizes, as salas ímpares confrontavam a luz da modernidade.

Enquanto Saturno e Júpiter vagueavam em algum lugar, esses astros distantes escutavam os gozos da Terra. Mas o homem estava confinado ao seu mundo de botões, em uma guerra de raios egocêntricos, assim como os astros em seus espaços distantes. O planeta Terra estava surdo para as vozes reais, enquanto somente as imagens transbordavam sentimentos.

E no divã moderno, o homem babava com sua tecnologia quadrada e em cores. Mas ele estava em sintonia com o mundo dos outros "astros", aqueles que também viviam em isolamento. "Vinte e Cinco Horas" de completa solidão, imerso em um mundo de ilusões, ele continuava sua jornada solitária no mar de imagens e sons que o rodeavam.


- Dizem que o próximo inimigo será outra telinha!


FIM

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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0508


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