* Nº 0301 - A BAILARINA DO FURO VELHO - SÉRIE: FÁBULAS DE MAYANDEUA
Havia uma vez, nas águas do Furo - Velho, uma jovem peixe-boi chamada Miturias. Ela vivia neste furo tranquilo que cortava a ilha e era diferente de todas as outras peixes-boi. Enquanto suas companheiras passavam os dias comendo capim aquático e cochilando à sombra das árvores, Miturias tinha uma paixão especial: dançar.
Tudo começou quando ela viu, pela primeira vez, um grupo de meninas brincando na margem de um rio. Elas usavam saias rodadas e giravam descalças ao som do vento. Miturias ficou maravilhada com aquela cena. As meninas pareciam tão felizes, livres e cheias de graça! A pequena peixe-boi resolveu imitá-las. Começou a fazer piruetas e saltos debaixo d’água, movendo-se como se fosse parte da correnteza. Para Miturias, cada onda era música, cada peixe era um parceiro de dança, e cada raio de sol refletido na água era aplauso.
Mas as outras peixes-boi não entendiam o que ela fazia. Achavam estranho ver Miturias rodopiando enquanto elas só queriam descansar ou comer. "Você é louca!", diziam algumas. "Pare com isso, você não é uma bailarina, é uma peixe-boi!", riam outras. Palavras duras ecoavam pelas águas, ferindo o coração sensível de Miturias. Muitas vezes, ela pensou em desistir. Talvez fosse melhor ser igual às outras, esquecer a dança e viver uma vida simples. Mas algo dentro dela gritava mais alto: seu amor pela dança. Era como se cada célula de seu corpo dissesse que ela nascera para isso.
Assim, Miturias continuou dançando, mesmo sozinha. Dançava ao amanhecer, ao entardecer, e durante as noites estreladas, quando a lua transformava a água em um palco prateado. Ela dançava com as ondas, com os cardumes de peixes e até com as estrelas que piscavam lá no alto. Miturias sabia que, embora ninguém a compreendesse, ela estava sendo fiel a si mesma.
Um dia, enquanto ensaiava sua coreografia favorita, Miturias notou alguém observando-a da margem. Era uma das meninas que havia admirado antes. Ela usava uma saia rodada e trazia uma flor atrás da orelha. Seus olhos brilhavam de curiosidade e admiração. A menina sorriu, acenou e disse:
— Você é incrível! Nunca vi uma dança tão bonita!
Miturias fez uma reverência graciosa e começou a dançar novamente, agora especialmente para sua nova espectadora. A menina aplaudiu entusiasmada e logo tirou os sapatos para entrar na água. Juntas, começaram a dançar, cada uma em seu elemento: a menina na margem, com passos leves sobre a areia molhada, e Miturias no furo, deslizando entre as correntezas. Giravam, pulavam e sorriam, conectadas por uma harmonia mágica. Aquela amizade inesperada trouxe luz à vida de Miturias, que finalmente sentiu que alguém a entendia.
As outras peixes-boi, ao presenciarem essa cena, ficaram surpresas. Observaram a alegria nos olhos de Miturias e perceberam o quanto tinham sido injustas. Sentiram remorso por terem zombado dela e resolveram pedir desculpas.
— Perdoe-nos, Miturias — disseram. — Agora entendemos que você é muito especial e tem um dom único. Queremos aprender a dançar também!
Com o coração aberto, Miturias aceitou as desculpas e decidiu compartilhar sua paixão. Transformou-se em professora, ensinando às outras peixes-boi os segredos da dança aquática. Ensaiavam juntas todos os dias, criando coreografias que encantavam os habitantes do mar de Algodoal e Mayandeua. As peixes-boi descobriram que dançar não apenas as deixava mais leves e felizes, mas também fortalecia seus laços de amizade.
Aos poucos, o furo onde viviam tornou-se conhecido como o "Reino das Bailarinas". Peixes, aves e até tartarugas vinham assistir às apresentações. E Miturias? Bem, ela realizou seu maior sonho: ser reconhecida como uma verdadeira artista, uma bailarina da vida.
Desde então, Miturias dançava não apenas para si, mas para inspirar outros a encontrarem sua própria essência. Sua história espalhou-se por muitos lugares, lembrando a todos que ser diferente não é um defeito, mas um presente. E assim, sob o reflexo das estrelas e ao som das águas, Miturias continuou dançando, livre e feliz, mostrando ao mundo que, seja humano ou animal, todos têm o direito de brilhar à sua maneira.
Moral da história: Seja fiel a quem você é, pois sua autenticidade pode inspirar o mundo.
FIM
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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0301