* Nº 0408 - SEGREDOS DA MATA - SÉRIE: FÁBULAS DE MAYANDEUA
Assim Primolius narrou:
Rouxinol faminto,
Á direita laranjeiras.
- Preso na gaiola!
Era uma vez, no coração da mata, um rouxinol cuja melodia encantava tudo ao seu redor. Seus cantos pareciam tocar o próprio espírito das árvores, e o vento carregava suas notas para além dos limites do horizonte. No entanto, naquela manhã, sua melodia estava silenciosa, abafada pela fome que crescia em seu peito.
Ele acordara cedo, com o estômago vazio e uma inquietação que o fazia saltar de galho em galho em busca de sustento. O sol mal havia nascido quando ele avistou, ao longe, um pomar. À direita, as laranjeiras se erguiam majestosas, carregadas de frutos dourados que reluziam como pequenas esferas de luz sob os primeiros raios do dia. Curioso e faminto, o rouxinol voou até lá. O aroma cítrico e doce o enchia de esperança, e ele pousou em um galho baixo para se deliciar com uma laranja madura. O suco fresco escorria de seu bico enquanto ele se alimentava, aliviando o peso da fome que o atormentava. Mas sua atenção foi desviada quando ele notou, entre as árvores, uma laranja ainda mais chamativa, repousando no centro de uma pequena estrutura metálica.
Era irresistível. Sem pensar duas vezes, o rouxinol adentrou a gaiola para alcançar o fruto. Bastou um instante de descuido: com um estrondo seco, a porta da armadilha se fechou, trancando-o dentro daquele espaço apertado e frio. Ele se debateu, batendo as asas contra as grades, mas era inútil. A gaiola não cedia. O rouxinol, antes dono dos céus, agora encarava a dura realidade de sua prisão. O mundo vasto e sem limites havia se transformado em um pequeno cubículo de ferro. A fome que o levara até ali desaparecera, substituída por uma angústia sufocante. Ele observava as laranjeiras ao seu redor, tão próximas e, ao mesmo tempo, inalcançáveis. Sua melodia desaparecera, assim como sua alegria.
Enquanto os dias se passavam, ele refletia sobre o preço de sua escolha. "Como pude trocar a liberdade por um instante de satisfação?" Pensava. Sentia saudade da vastidão dos céus, do frescor do vento e do canto compartilhado com outros pássaros. Agora, restava-lhe apenas o silêncio e a companhia das grades que o cercavam. Então, em um certo dia, algo inesperado aconteceu. Passos leves se aproximaram do pomar. Era uma criança, com olhos brilhantes de curiosidade e compaixão. Ao avistar o rouxinol preso, o menino parou. Ele se abaixou, examinou a gaiola e, sem hesitar, abriu a porta com cuidado. O rouxinol hesitou por um momento, como se não acreditasse na possibilidade de liberdade. Mas então, com um impulso de suas asas, ele voou.
Ao ganhar os céus novamente, sentiu o vento em suas penas e o calor do sol em seu corpo. Uma alegria indescritível o envolveu, e ele cantou como nunca antes. Suas notas ecoaram novamente pela mata, levando uma mensagem que ele agora compreendia profundamente:
"A liberdade é o maior tesouro que um ser pode possuir. Nem o fruto mais doce do mundo vale o preço de perdê-la."
De volta à floresta, ele retomou sua vida, mais sábio e grato por cada instante sob o céu aberto. E sempre que avistava uma laranja dourada, lembrava-se de sua história e do valor de sua liberdade.
Ele nunca mais viu a luz do sol nem ouviu o canto dos seus amigos.
Á direita laranjeiras,
Preso na gaiola,
- Rouxinol faminto!
E assim ele aprendeu:
A liberdade é o bem mais precioso que existe!
FIM
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Projeto Musical e Literário Primolius Nº 0408