*Nº 0355 - NA PRESIDENTE VARGAS - SÉRIE: CRÔNICAS DE MAYANDEUA
O inverno chegou em Belém e trouxe consigo a chuva que não parava de cair. As ruas da cidade ficavam alagadas, os carros buzinavam, as pessoas corriam para se abrigar. No meio da confusão, um homem de cabelos grisalhos se destacava. Ele vendia guarda-chuvas coloridos na esquina de uma avenida movimentada. Ele não se importava com a água que escorria pelo seu rosto e pelas suas roupas. Ele sorria para os clientes, para os transeuntes, para o céu. Ele parecia feliz com o seu ofício.
Ele era observado da janela de um escritório por um jovem curioso. O jovem ficava intrigado com a sua história, com o que o fazia tão contente em meio ao caos. Será que ele gostava da chuva? Será que ele tinha uma família? Será que ele tinha sonhos? O jovem se perguntava se ele sabia que os seus guarda-chuvas eram como flores que enfeitavam a paisagem cinzenta da metrópole. Ele se perguntava se o vendedor sabia que era um artista.
Decidido, o jovem saía do seu trabalho e ia até ele. Queria conversar, saber mais sobre ele, comprar um dos seus guarda-chuvas. Mas quando ele chegava na rua, o vendedor já não estava mais lá. Só via os rastros de água que ele deixara no chão. Talvez ele tivesse ido para casa, para o bar, para outro lugar. O jovem ficava frustrado por ter perdido a oportunidade de conhecê-lo.
Voltava para o seu escritório, molhado e decepcionado. Olhava pela janela e via que a chuva continuava caindo. Sentia falta do homem grisalho e dos seus guarda-chuvas. Sentia falta da sua alegria e da sua arte. Sentia que perdera algo importante.
Pensava que talvez o encontrasse de novo em outro dia, em outra esquina, em outra estação. Pensava que talvez pudesse lhe dizer o quanto admirara o seu trabalho, o quanto se inspirara na sua atitude, o quanto se encantara com a sua arte.
O jovem pensava que talvez o homem fosse o seu anjo da guarda.
Enquanto isso, na ilha de Mayandeua, a chuva do inverno trazia um clima diferente. A ilha, sempre verde e cheia de vida, parecia revigorada com a água que caía dos céus. As casas de madeira, elevadas sobre palafitas, brilhavam sob a chuva, enquanto os rios corriam com força renovada.Na margem do rio, um velho pescador de chapéu de palha ajustava suas redes. Ele não se importava com a chuva; na verdade, ele parecia prosperar com ela. As águas agitadas traziam mais peixes, e ele sabia exatamente onde lançar suas redes para uma boa pescaria. Seus olhos, cheios de histórias e experiências, observavam o movimento da natureza com respeito e sabedoria.
Um garoto da vila, fascinado pelo pescador, o observava de longe. Ele ficava intrigado com a destreza do velho, com a calma que demonstrava em meio à tempestade. Será que ele tinha segredos sobre o mar? Será que ele sabia contar as histórias da ilha? O garoto queria aprender tudo o que ele tinha a ensinar. Um dia, decidido, o garoto se aproximou do pescador. Com timidez, pediu para acompanhá-lo na pesca. O velho pescador, com um sorriso gentil, aceitou a companhia. Juntos, passaram horas no rio, o pescador ensinando o garoto a lançar a rede, a entender os sinais da água e a respeitar os ciclos da natureza.
Enquanto pescavam, o velho contava histórias sobre espíritos da floresta, sobre antigas tradições e sobre os segredos do rio. O garoto, com os olhos arregalados de curiosidade, absorvia cada palavra. Sentia-se parte de algo maior, uma conexão profunda com a ilha e seus mistérios. Quando a chuva finalmente cessou, o garoto e o pescador retornaram à vila com cestos cheios de peixes. A experiência havia transformado o garoto. Ele agora via a chuva e o rio de maneira diferente, com um respeito e uma admiração renovados. À noite, ao redor de uma fogueira, o garoto compartilhava com sua família as histórias que ouvira. Ele sabia que aquelas lições e memórias ficariam com ele para sempre, e que um dia, ele também seria um guardião das tradições e dos segredos de Mayandeua.
E assim, tanto em Belém quanto em Mayandeua, a chuva do inverno trazia mais do que apenas água. Ela trazia conexões, aprendizagens e a certeza de que cada dia, cada encontro, podia ser transformador. O jovem e o garoto, cada um em seu próprio contexto, descobriram a beleza oculta na simplicidade e a profundidade das histórias que se entrelaçavam com a vida ao seu redor.
- Vidas, quase diferentes!
FIM
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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0355


