*Nº 0008 - O SONO ETERNO DO GRINGO - CONTO
Enfrentando severas dificuldades financeiras, um estrangeiro desesperado escreveu para seu advogado, confessando que não suportava mais o fardo de seus problemas econômicos. Na quarta-feira, véspera de seu aniversário, tomou uma decisão drástica: exonerar todo o quadro de funcionários de seu empreendimento. Com uma voz grave e austera, reminiscente de um militar reformado, anunciou a dolorosa notícia pelos alto-falantes de sua empresa, expressando pela última vez seu autoritarismo.
Após a triste comunicação, convidou a imprensa local para compartilhar, com um ar de dignidade forçada, as batalhas que travou como empresário na capital. Esfomeado por descanso, retornou ao seu apartamento na Avenida Nazaré, onde esperava encontrar a tranquilidade tão necessária em seu leito paraoara.
No entanto, o mundo ao seu redor havia mudado radicalmente nas quentes horas de Belém. A poluição sonora havia aumentado significativamente naquele movimentado logradouro da cidade, e a paz que outrora conhecera havia desaparecido. Ao entrar em seu apartamento, tirou os sapatos e toda a roupa, deitando-se na velha cama de seu falecido pai com um sorriso no rosto. Murmurou uma prece para Deus, recordou-se de sua terra natal e adormeceu em um silêncio perturbado por sua respiração irregular. Com a pele livre e o espírito em paz, o estrangeiro faleceu aos 35 anos, nas terras do Norte do Brasil. Assim, nos braços de sua cama de lençóis com aromas de ervas amazônicas, celebrou seu último aniversário. Certamente, relembrou das morenas de cabelos longos da ilha de Mayandeua e das delícias culinárias daquela terra ensolarada.
Foi encontrado sorrindo em seu leito de morte por sua companheira, que vivia na Ilha de Algodoal. Pasmem! Ela estava grávida.
- Mas, esta é outra história.
FIM
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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0008