* N° 0249 - AMARELADO INVERNO - SÉRIE: CRÔNICAS DE MAYANDEUA


As frutas caem. Não é um tombo qualquer, mas uma entrega. Estrelas amareladas que se desprendem do céu verde dos bacurizeiros, sacudidos por um vento que anuncia a chuva. No impacto, a terra se veste de aroma. Taperebás, simples taperebás, mas que na memória gustativa se transformam em portais para um tempo mais puro.

Ah, a sinestesia da infância! A língua dança com os sabores, e cada toque desperta canções adormecidas no coração. Araçás, mangas, goiabas, mangabas... nomes que ecoam como versos de um poema esquecido. No colo do tempo, essas frutas são mais que alimento; são a chave para reacender os elementos de um passado feliz. O cheiro da manhã que chega é o mesmo do bacuri adormecido, esperando para ser despertado pelas mãos ansiosas.

E que mãos! Lambuzadas de açúcar e sementes, unidas na sinfonia da gula infantil. Pássaros, formigas e meninos disputam o banquete, cada um defendendo seu território de sabor. A chuva se aproxima, mas a guerra na boca é mais urgente, mais vital. A vida se revela no horizonte, carregada de promessas e memórias.

O cheiro que emana dessas frutas tem o poder de nos transportar de volta ao útero da infância. Mayandeua, a terra mágica onde os sonhos nascem, se materializa no pensamento. E ali, no reino da inocência, comer taperebás na chuva é um ato sagrado. Degustar mangas com farinha ao meio-dia, uma aventura épica. Correr pelos quintais no inverno, uma celebração da liberdade.

Amarelas... apenas amarelas? Não, muito mais que isso. Amarelas como o sol que ilumina as lembranças mais queridas nas dunas das ilhas.  Amarelas como a felicidade que teimamos em buscar nos sabores simples da vida.


Amarelas, apenas amarelas!

FIM

Copyright de Britto, 2021
Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0249

Mensagens populares