*Nº 0040 - HORAS MORTAS DE MAYANDEUA - SÉRIE: CONTOS FANTÁSTICOS DE MAYANDEUA
Um instante: O sol do meio-dia ardia no céu de Mayandeua. Dona Rita, com pilão nas mãos, fazia uma prece silenciosa para as horas mortas, sob a sombra eterna da velha ameixeira. Era um ritual diário, um momento sagrado de reflexão e gratidão. No puleiro, os ovos estavam acomodados cuidadosamente. A prece continuava, ecoando no ar. Mulher e boto brincavam nos rios, a "saliência" das águas trazendo vida e movimento. Canoas amarradas balançavam suavemente, enquanto peixes se escondiam, todos acomodados em seus refúgios.
Um instante: O feroz sol das treze horas queimava a terra. As preces agora eram para os curupiras e caiporas, os espíritos das matas e manguezais. Corpos e energias fluíam pela floresta, conectados à natureza. Cuias, facões e chapéus estavam espalhados, testemunhas mudas do trabalho árduo. O caboclo matutava sobre o trabalho do amanhã. Mayandeua nunca parava, nem mesmo nessas horas de calor intenso. Os peixes da maré matutina ainda descansavam sobre os giraus. A carne de tatu queimava nas panelas, exalando um aroma forte. A farinha de lata e os pães de Santo Antônio estavam prontos, aguardando para serem servidos. Os potes encharcados das cacimbas encantadas brilhavam sob a luz do sol. Dona Rita continuava a socar os grãos de café no pilão.
Instantes de aqui: As redes nas cumeeiras balançavam suavemente, embalando os habitantes de Mayandeua. Recantos e contos se entrelaçavam, histórias de vidas vividas e sonhos compartilhados. A chuva, prometida pelas nuvens, logo cairia, trazendo consigo um frescor renovador. Uma prece para os caboclos: Homem e natureza rezavam suas crenças em harmonia. Na rede, dona Rita dormia a sesta das horas mortas, um sono tranquilo, embalado pelas canções da floresta. Em cada instante, Mayandeua vivia sua magia, um lugar onde o tempo parecia suspenso, onde a natureza e os seres humanos coexistiam em perfeita sinfonia.
Tardes de Mayandeua.
(Bacuris caindo lá no fundo mata)
FIM
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Projeto Musical e Literário Primolius Nº 0040