Nº 0931 - OUTRO GUARDIÃO DA TRILHA ENCANTADA - SÉRIE: CRÔNICAS DE MAYANDEUA

 


A trilha serpenteava pelas veredas, a manhã revelando paisagens de beleza estonteante. De repente, o silêncio foi quebrado por um canto peculiar, um chamado vibrante na mata. "É o Anu-branco!", exclamou o guia, um conhecedor profundo dos segredos da ilha. Quase como resposta, um bando de seis a doze aves, com suas plumagens alvas contrastando com o verde denso, cruzou nosso caminho em voo rasante. "Já viram um milhão de anus-brancos?", perguntou o guia, com um sorriso enigmático. A questão, retórica, pairou no ar. Respondemos com um uníssono "não", a curiosidade despertada.

"Dizem os mais antigos", continuou, "que no ninho do pássaro, entre os ovos, sempre se encontra uma pedrinha de ouro." A história,  provocou olhares incrédulos e sorrisos divertidos. Que grande lorota!, pensamos. Outro morador, juntando-se à conversa, acrescentou: "Para muitos, o canto dele anuncia a morte. Por isso, não são bem-vindos em algumas regiões." Uma sombra pairou no ar com essa revelação.

Apesar da superstição, o pássaro exerceu um fascínio irresistível. Ao longo da trilha, tentamos fotografá-lo, aproximando-nos com a delicadeza de quem se aproxima de um mistério. Em certo momento, um cheiro forte e peculiar invadiu o ar, um odor que poucos de nós havíamos sentido antes. Mesmo assim, clicamos a foto do Anu-branco, que posava com elegância sobre um galho seco, indiferente ao aroma.

Continuando a jornada, notamos que os aqueles pássaros, de alguma forma, nos seguiam, acompanhando nosso trajeto. De repente, surgiram enfileirados, pousados em pequenas árvores, como sentinelas silenciosas. O guia mais experiente, comentou: "Eles estão nos vigiando." Um arrepio percorreu nossas espinhas.

A paisagem desfilava: palmeiras imponentes, outros pássaros cruzando o céu, a areia da piçarra, o barro escorregadio, a vegetação exuberante, revigorada pela chuva da noite anterior, apesar das cicatrizes da maldade humana. A ilha respirava, observada pelos guardiões alados.

Retornando ao tema daqueles pássaros, o guia revelou: "Segundo os mais antigos , eles são os porteiros da mata.  Dizem que aquele que cruza o caminho de um Anu-branco, para sempre ficará encantado com a beleza da ilha."

Concordei plenamente. Além da beleza física, o canto do Anu-branco era hipnotizante, transmitindo uma sensação de paz e harmonia, uma conexão profunda com a natureza. Observando-o com atenção, percebi que ele também guiava outros pássaros, como se lhes indicasse o caminho. Algo que, sem sua orientação, eu jamais teria notado.

Outros moradores, juntando-se à conversa, revelaram que aquele pássaro, era conhecido como o protetor das matas. "Quando eles nos seguem," explicou um deles, "estão ou nos protegendo, ou protegendo a mata." A dúvida pairou no ar, carregada de significado. Éramos em seis ou doze pessoas, um grupo considerável. Qual seria o motivo de tamanha atenção?

Decidimos acreditar que o Anu-branco estava nos protegendo, guiando-nos em segurança pelos caminhos de Mayandeua. E assim, com um sorriso cúmplice, firmamos a convicção de que éramos abençoados.

E assim foi na travessia pela Trilha Encantada de Mayandeua!


FIM

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Projeto Literário e Musical Primolius N° 0931


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