* Nº 0648 - MULA MARINHA DE FORA - SÉRIE: CRÔNICAS DE MAYANDEUA
Na vila tranquila de Maya, onde o mar conversa baixinho com a areia e o horizonte parece sussurrar segredos antigos, nasceu uma história que se espalhou como o vento. Não era apenas uma lenda para entreter; era um chamado, um lembrete de como a natureza e a vida estão entrelaçadas. E no centro dessa narrativa estava a magnífica mula do mar de fora.
A cada manhã, quando o sol tingia o oceano, a mula surgia, emergindo da linha onde céu e água se encontravam. Seu corpo brilhava como as ondas ao entardecer, e seus olhos guardavam a profundidade de histórias nunca contadas. Era como se ela trouxesse consigo os ecos de terras distantes, uma mensageira dos mistérios e da beleza dos mares.
Mas havia algo mais em sua presença. Uma fragilidade que não combinava com sua grandiosidade. Por trás do brilho dos olhos e da imponência de sua figura, a mula carregava as marcas de um mundo onde a compaixão muitas vezes cede lugar à crueldade. Entre os moradores da vila, alguns viam na mula um ser mágico, digno de reverência. Outros, no entanto, enxergavam apenas uma criatura para explorar, incapazes de perceber a preciosidade de sua essência. E assim, em passos lentos pela areia, a mula se tornava um símbolo da escolha humana entre luz e sombra.
Cada movimento seu parecia sussurrar uma mensagem. As ondas ao redor dela dançavam como para reforçar suas palavras invisíveis: “A dignidade é a base de toda harmonia. Preservem-na.” Os habitantes mais sábios da vila começaram a ouvir. As crianças passaram a correr ao seu lado, rindo, mas sem jamais ultrapassar os limites da gentileza. Os pescadores, ao vê-la, deixavam seus barcos repousarem, como se sua presença fosse um lembrete de que havia algo mais profundo do que o trabalho e o cotidiano.
Mas nem todos ouviram. Havia aqueles que insistiam em subjugar o que não entendiam, e a mula, apesar de sua majestade, não era imune. Suas marcas contavam histórias de abusos e descuidos. Foi então que a vila decidiu agir. Reuniram-se, ao som das ondas, e criaram um refúgio. Um lugar onde a mula pudesse andar livremente, sem medo, sem dor. Onde sua presença pudesse inspirar, e onde o respeito fosse uma prática, não apenas uma promessa.
E naquele refúgio, a mula tornou-se mais que um símbolo; tornou-se um lembrete vivo. Seu caminhar pela areia, agora sem pressa, era uma celebração da escolha pelo cuidado, pela luz, pela empatia. A história da mula do mar de fora não termina na vila. Ela ecoa em cada um de nós, um convite para que vejamos a natureza não como algo a ser explorado, mas como algo a ser protegido. Porque, no fundo, todos carregamos um pouco daquela vastidão em nossos corações.
- Façamos a nossa parte! Preservemos a nobreza que existe em toda vida.
FIM
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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0648