*Nº 0503 - A PRINCESA DE ALGODOAL - SÉRIE: CONTOS FANTÁSTICOS DE MAYANDEUA
Em uma era de descobertas e desbravamentos, quando os ventos do desconhecido sopravam com força nas velas das naus audaciosas, navegadores intrépidos cruzavam oceanos em busca não apenas de novas terras, mas também de histórias que pudessem ecoar através dos séculos. Entre esses relatos imortais, emerge a lenda da Princesa de Algodoal, um conto que mistura amor, sacrifício e o eterno conflito entre tradição e liberdade. A história se passa em um cenário de beleza quase irreal: as águas cristalinas e misteriosas próximas à ilha de Mayandeua, onde a natureza selvagem parecia guardar segredos ancestrais, sussurrados ao ritmo das marés da Costa.
A bordo de uma nau majestosa, liderada por um capitão honrado e temido, viajava sua jovem filha, uma princesa de espírito livre e coração apaixonado. Ela era como uma estrela errante no convés da embarcação, sempre buscando horizontes além do que lhe era permitido. Ao seu lado, uma tripulação composta por homens rudes, mas leais, que enfrentavam os perigos do mar com coragem inabalável. Entre eles destacava-se Kairos, um jovem marinheiro cujos olhos refletiam tanto o brilho das estrelas quanto a bravura das ondas. Ele era conhecido por sua habilidade em navegar pelas correntezas mais traiçoeiras, mas também por sua alma gentil, que parecia destoar do mundo duro ao qual estava acostumado.
O destino, como as marés, é imprevisível. Foi durante uma noite de céu límpido, enquanto a lua derramava sua luz prateada sobre o convés, que os caminhos da princesa e do marinheiro se entrelaçaram de maneira irrevogável. Seus olhares se encontraram pela primeira vez sob o véu das constelações, e foi ali que nasceu um amor tão profundo quanto o oceano, mas tão proibido quanto os recifes ocultos sob a superfície.
Os dias que se seguiram foram marcados por encontros furtivos e promessas murmuradas ao som das ondas. No entanto, o amor que florescia entre eles era como uma chama em meio a lenha seca: belo, mas perigoso. Quando o capitão descobriu o romance secreto, sua ira foi como uma tempestade devastadora. Para ele, aquele sentimento não era apenas uma transgressão às normas sociais, mas uma afronta direta à sua autoridade e ao legado familiar. Consumido pelo orgulho e pela tradição, ele ordenou que Kairos fosse punido severamente, lançado às águas revoltas como exemplo para todos os que ousassem desafiar suas ordens.
Desesperada, a princesa implorou ao pai por misericórdia, mas suas palavras caíram como folhas secas diante da tempestade. Em um ato de coragem e desespero, ela tomou a decisão mais difícil de sua vida: lançar-se ao mar junto com seu amado, escolhendo o abraço das águas ao vazio de uma vida sem amor. O grito angustiado da princesa ecoou pelos confins do oceano, paralisando a tripulação e deixando o capitão mergulhado em um silêncio carregado de culpa.
Dizem os moradores mais antigos da região que, desde aquela noite fatídica, a ilha que um dia iria ser chamada de Algodoal foi envolta por um véu de mistério. Durante as noites de lua cheia, uma figura enigmática emerge das profundezas. É a princesa, vestida em um manto feito de espuma e saudade, vagando entre os vivos e os mortos em busca de redenção. Sua presença é sentida nas brisas suaves que acariciam os rostos dos visitantes, nas melodias tristes que parecem dançar com as ondas e nos sussurros que ecoam pelas praias desertas.
Mas a história não termina aqui. Com o passar dos anos, a história da princesa se fundiu com outras narrativas locais, criando um rico mosaico de mitos e lendas. Alguns afirmam que Kairos também vagueia pelo mar, preso em uma jornada eterna, guiando os perdidos nas águas. Há ainda quem diga que, em noites de tempestade, é possível ouvir o som de risos e lágrimas misturados, como se a própria ilha chorasse pela tragédia que marcou sua história.
Assim, enquanto o sol se põe sobre as águas de Algodoal, a princesa continua sua jornada solitária. Ela é um símbolo de amor inabalável, coragem indomável e o desejo eterno por paz. E assim, a cada nova geração, sua história é recontada, adaptada e ampliada, perpetuando o encantamento que transcende o tempo e continua a fascinar os corações daqueles que ouvem seu eco nas margens da ilha e nas profundezas de suas águas mágicas.
Hoje, os visitantes que chegam a Algodoal são convidados a caminhar pelas praias ao entardecer, onde o vento parece carregar consigo fragmentos daquela história antiga. Quem sabe, em algum momento, possam vislumbrar a princesa, cuja essência permanece viva nas memórias coletivas e no eterno movimento das marés daquela ilha encantada.
- Primolius assim narrou!
FIM
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Projeto Literário e Musical Primolius Nº 0503